Esquecer e emudecer? NUNCA - a partir de “O Evangelho da Terra segundo a serpente” de Natália Amoreira
- capivara crítica
- 28 de abr.
- 2 min de leitura
Toda vez que um novo evangelho é publicado, é documentada no mundo uma nova história e uma nova perspectiva sobre a existência. É assim também com a obra de Natália Amoreira, não porque a história que ela nos apresenta é nova, mas porque ela escolhe documentá-la, fazer valer em papel. Para, existindo nesse mundo, evitar que seja novamente apagada.
Ela não faz isso apenas com o que já existe, mas nos convoca a escrever junto, em um caderninho vermelho, tudo aquilo que não pode ser esquecido.
Natália assume aqui a figura de andarilha, com metade do rosto em carne e osso e a outra metade só osso. Vejo uma relação com “Kaim” de Dione Carlos, mas trazendo para a mulher o que antes estava no monólogo do primeiro fratricida da história humana. Da mesma forma que Dione, Natália toma a religião cristã e a subverte para fazer-se valer nas suas palavras. Isso no livro, mas também aqui.
Da mesma forma que o livro, também da artista, essa lecture-performance é habitada de humor, e de muita vingança, no melhor sentido dela. É peitar o esquecimento através da tiragem de cartas de Tarô. Nessa apresentação, foram apenas 3 das 22 arcanas maiores, porque era o que o tempo permitia. E esses 3 episódios descem engasgados, são difíceis de absorver, mas absolutamente necessários. Fica evidente o quanto precisamos dessa performance, uma vez que o público do itaú demorou bastante para repetir “eu me lembro” em um momento da performance em que o nome de várias mulheres é ecoado para ser lembrado. Demoramos para nos lembrar e para pedir que esses nomes sejam lembrados. Cabe pensar o porquê.
Natália então evoca as marias: dos prazeres, padilha, navalha e por aí vai e nesse momento são convidadas ao palco diversas artistas que participaram desta edição do a_ponte. Elas estão ali para serem celebradas por suas vidas, e também jamais esquecidas por todo mundo que anda com elas.
A raiva está explícita, e ela é justa, porque para falar de justiça é preciso cobrar quem a tirou. Que ressuscite o fantasma do pai de Hamlet para jamais deixar-nos esquecer do que acontece nesse mundo!

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