NÓS ESTAREMOS NO FUTURO - sobre Tremores, sobre a luz dos vaga-lumes, de Coletive Avertere
- capivara crítica
- 28 de abr.
- 2 min de leitura
Se a produção cultural hegemônica tende a um futurismo distópico, no qual o sistema opressivo se mantém ad eternum, as obras mais pungentes apontam outros caminhos. Não falo de amanhã perfeitos, nas quais as contradições seriam superadas, mas sim de espetáculos que mostram como, apesar de toda a opressão, continuamos e continuaremos aqui.
É o caso de Tremores, que projeta a resistência de vidas dissidentes de gênero para um futuro governado pelo “Cimento”, regime autoritário que persegue e encarcera essa população em prisões chamadas “Metamorfose”. Para instaurar essa ficção - ao mesmo tempo, tão próxima da realidade - a peça se estrutura em três momentos, que constroem não só a fábula, mas reconstituem uma outra visão de tempo.
Entramos no antigo armazém da Vila Maria Zélia e vemos um epílogo, no qual é narrada e dançada a história ancestral da Deusa Koudine, mito fundante da população dissidente. Em seguida, são estabelecidos três núcleos que se entretecem e se ressignificam: três pessoas encarceradas na “Metamorfose” descobrem as inúmeras possibilidades de seus corpos - elemento ressaltado pelas diferentes articulações propostas pelo Vogue e Waacking; um pai e uma mãe resistem a aceitar que sue filhe é não-binárie, e ameçam enviá-lu ao “Metamorfose”; jornalistas da resistência planejam invadir o “Metamorfose” e libertar todas as pessoas encarceradas. Ao fim, no epílogo se desenha uma marcha para Marsha, retomando a figura histórica de Marsha P. Jonhson, líder da Rebelião de Stonewall.
Assim, a peça parte da ancestralidade, adentra no plano interpessoal das descobertas corporais e das relações familiares, para então alcançar a articulação política e a resistência de antepassadas recentes. Na medida em que e coletive articula o ontem - tanto mítico quanto documental - o hoje - tanto fabular quanto material - e o amanhã - tanto oracular quanto histórico -, há um redimensionamento do Tempo e do que seria o Futuro, escapando da visão segundo a qual o fim é inevitável, abrindo a possibilidade para que - parafraseando Jota Mombaça - não nos matem agora.

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